Reino Sub-Imundo
Fernando Sales
Baseado em fatos reais.
Aos titiquistas e digitalistas.
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MAPA DO MUNDO OBTUSO E DO REINO SUB-IMUNDO
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ANÁLISE
CULTURAL ELEMENTAR
Nome oficial: Reino
Sub-Imundo e Distante dos Alisamentos Capilares.
Nome popular: Reino
Sub-Imundo.
Língua: modês.
Nacionalidade:
sub-imunda, encardida, reinodistântica ou lisense.
Moedas: auro e
pólar.
Países: Damo,
Faixa de Paza, Faixa de Pizza e Agito.
Principais cidades: Distúrbico, Padrid, São Nunca, São Ninguém e Nhoque.
Principais guerras: Segunda Guerra Outonal, Primeira Guerra Hibernada, Guerra Morna Entre
as Faixas, Guerra Surpresa contra o Mundo Obtuso e Guerra da Divina Comédia.
Clima:
chuvoso; artificialmente ensolarado.
Passatempos:
assistir a desfiles de modas, assistir a jogos de axilabol, assistir a rodeios,
assistir.
Religiões oficiais: Idademedismo e Jucaísmo.
Religiões não-oficial: greválica.
Comidas tradicionais: rabiole, pizza, escargô, ostra, pimenta e nhoque.
Índice
Prólogo – O exorcismo de mim
mesmo
Capítulo I – Alguns neo-heróis
sub-imundos em seus primeiros atos notáveis
Capítulo II – A motivação
primeira do relato: os alisadores capilares
Capítulo III – “Do amor e outros
demônios da luz”
Capítulo IV – Núcleo socioilógico do Reino
Sub-Imundo
Capítulo V – Da mediocridade à
mediocridade
Capítulo VI – O monumental
capítulo em que um líder se estarrece às portas da mendicância
Capítulo VII – De
filósofo-de-boteco a contrabandista-de-livros
Capítulo VIII – De etnodminador a
ajudante-de-mendigo
Capítulo IX – A violência como
redenção dos fracos ou a profundidade até então ignorada
Capítulo X – Os mais importantes
relatos da periferia lisense ou autoafirmação titiquista
Capítulo XI – Sub-religiões ou o
comércio da fé
Capítulo XII – Algumas curiosidades sobre a
elite econômica liso-capilar
Capítulo XIII – Desenlace de um
capeta
Capítulo XIV – Desenlace de um
santo
Capítulo Final – O resgate
PRÓLOGO –
O EXORCISMO DE MIM MESMO
“[A Filosofia de massas] É usada
até hoje para manipular as pessoas e garantir o status quo do capitalismo, levando as pessoas ao consumo exagerado,
às modas sem sentido, à construção de líderes títeres, à manipulação das
massas, como no nazismo, nas eleições, na criação de necessidades artificiais e
não necessárias, que são tornadas necessárias e naturais, e assim por diante” –
Francisco Martins de Souza
Contarei a presente história
porque me afogo em autotrevas, porque me consumo em um perverso automartírio.
Destruir a si mesmo é uma comédia humana rotineira neste novo mundo;
tecnicamente, pode-se dizer que é até um hábito, não chega sequer a ser
novidade. Venho, portanto, para destruir arredores. Sou uma espécie de
camicase-sem-ideologia-a-defender – ainda. Vim para difundir entre as donzelas
desse Reino Sub-Imundo o suor proletário e fétido de que tanto elas têm
escapado! Ora, não sou só um funcionário, madames! Acredite, apesar do que
minha carteira-de-semi-escravidão diz, eu sou um homem-bomba. Eu vou explodir-me
e explodi-las ao final deste livro!
Isso posto, meus amigos
atlântidos, verdadeiros motivos desta obra, quero apresentar-lhes alguns de
nossos heróis, essa gama mendicante e gloriosa de nossos heróis. Eis Greval
Desconcertado, nosso Camões ou Quixote, a lutar contra a burrocracia; eis
Souropeaux, glorioso ex-mendigo-e-ex-filósofo que se tornou
traficante-de-livros; eis também, atrás de um leque da marca Meabano, Esníguio,
o alisador-de-cabelos, maior espectador de desfiles de todo o reino! Essas e
outras fortes presenças passeiam sobre minha vista como se ainda estivessem
aqui diante de meus olhos, como agora há pouco, da última vez em que os vi...
Ah, eis que surge Lúcsia, nossa
Dulcineia Del Toboso. Oh, mulher admirável, como poderia faltar em tão marcante
rememorar? Que me importa se foste a meretriz da bondade, se vendeste a alma à
justiça? Sim, a ti eu digo sim, e a ti venerarei até o fim de minhas páginas!
Não me esquecerei de vós, ó João
Pedro II, meu caro e envenenado governante! Eis nosso guia em meio à
cacoexistência lisense. Quero abraçar-vos e fazer convosco o melhor discurso
paulítico e pobrelista jamais existente. Quero ser o desgosto de vossa fama de
orador-e-oráculo. Não mereceis serdes chamado tão injustamente de Vilão!
Francos atlântidos, as histórias
que temos visto não fazem mais do que deitar panos quentes sobre as
feridas-dos-de-sangue-azul e afagar confortavelmente os benefícios da
pós-modernidade; as histórias que temos ouvido, meus amigos, não passam de
tapinhas inocentes nas costas de uma elite irresponsavelmente alojada em
belíssimos castelos de sangue só-operário. Eu quero ser o vinagre que infecta
os vinhos de Fabrícia. Quero ser a prisão-do-ventre-intelectual dessa
neonobreza que tem sempre nos lançado sua verborréia. Eu não quero ser
paparazzo em seu aniversário de cachorro, madame! Ah, não realize meu pior
pesadelo: não me lance ao campo-florido-e-superficialmente-feliz da futilidade.
Enfim, meus caros de Atlântida,
meus parceiros superiores, quero pedir inspiração não a dezenas de ninfas do
Tejo, esse típico exemplo apolíneo de desprezo à realidade, mas quero me
inflamem o coração milhares as belezas ignoradas nos guetos da sociedade
liseta, ultrajadas e humilhadas por serem matéria-prima para a banalização da
sexualidade infantil e pré-adolescente. A partir delas é que hei de nutrir meu
ódio, meu sangue fervente!
Oh amigos, não lhes desejo a
beleza de uma vida serena em apertamentos de metópolis nem o excessivo Agito
dos zumbimaníacos. É preciso conhecer, é preciso mergulhar no Sub-Imundo para
conhecê-lo! E é cá que nos encontramos! E é aqui que nós moraremos e
provavelmente morreremos, atlântidos! Mas se sobrevivermos, voltaremos ao
Paraíso Perdido renascidos. Mergulhemos! Mergulhemos!
CAPÍTULO I - OS NEO-HERÓIS
SUB-IMUNDOS EM
SEUS PRIMEIROS ATOS NOTÁVEIS
Parte I – do culto anual a
Dionísio, sedento deus do vinho; das primeiras tendências de Souropeaux,
filósofo-de-bar.
Ocorre, meu amigo Úmero, que
Souropeaux fazia o tipo observador, enquanto o fogo ardia nos corações dos
dionisíacos foliões. Era uma multidão que coreografava nesse exato momento a
música-do-corpo, importada diretamente do Mundo Obtuso, continente situado a
oeste do Reino Sub-Imundo. Tal música era na verdade mantida por um tambor
batido repetidamente no mesmo ritmo e sua letra era uma instrução sistemática
de movimentos dada por um belo cantor (de beleza criada e garantida pela
destacadíssima mídia lisense).
As dançarinas improvisadas pela
política-do-álcool seguiam rigorosamente suas ordens. Pequenas mãos e grandes
pés agora se levantam, abaixam-se, batem-se, giram, contorcem-se. Eis que o
Carnaval alisado se assemelha profundamente a uma orgia de proporções
estrondosas, apoteóticas, bacantes, na visão do filósofo Souropeaux, que
observa de longe, cremos, friamente.
Não é que desembarcamos
exatamente na Festa da Carne, Úmero Card’Osso?! Molhe um copo, tome um gole,
estamos apenas a começar esta longa e espetacular jornada por caminhos de
Hades.
Um susto! Casais começam a se
digladiar e a se amar, simultaneamente, impunemente, sinceramente, pelo chão,
em pleno centro de Distúrbico, essa mais importante cidade reinodistântica. A
tão desavergonhada liberdade sexual, Souropeaux tenta encarar com naturalidade,
simulando uma aceitação pacífica, que não tinha, aos atos ditos imorais.
E, de repente, em meio àquela
praça, que é o centro de toda cultura sub-imunda, em um estilo razoavelmente
romano-bacante, todos os cinqüenta mil presentes, entre subumanos e
sobre-viventes (menos o filósofo, menos o filósofo abismado!), estão sem roupa,
nus em pelo, aos modos de se expressar de minha avó.
Em meio a essa grandiosidade, um
homem se destaca. É o presidente do Reino Sub-Imundo, João Pedro II, que está
sendo carregado por cinco menores de idade.
Souropeaux, meticuloso, faz anotações em sua caderneta, enquanto
esconde, juntamente com sua inveja, o desejo de ser só-mais-um-com-o-todo. Seu
isolamento social pesa, sua crosta de ressentimento massacra, sua adiposidade-cerebral
o descontenta. (Ele não sabe, Úmero, o bem de ser só. Ainda não descobriu como
o encontro consigo mesmo pode ser útil para a potência interpessoal). E, no
momento da integração maior, em que o cantor de dança-do-corpo dá sua última
coordenada, indescritível aqui, mas que soa automaticamente como uma instrução
atlético-sexual, o ser isolado, nosso Souropeaux, desfaz-se em lágrimas.
Temos à nossa frente, amigos
atlantes – Card’Osso, Gustavo Caipira, Lucas Salles, Lucca Moreti, Bea
Rodrigues, João Martins, Eduardo Dudu, Karen Winehouse –, vocês que são minha clarividência
noturna, guias mesmo de minha caminhada... Temos a Triste Figura de um
filósofo-cultuador-da-morte, classe sofredora que mendiga por essas ruas
distantes. Notem vocês que me ouvem, oh atlântidos, que agora começam a
conhecer este reino: Souropeaux faz parte de uma linha de pesquisa
arcaico-acadêmica – a teoria.
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Continua em...
http://professorfernandoletras.blogspot.com.br/2013/10/parte-ii-e-mque-fica-nitido-que-o-bar-e.html
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